Sabe, acho que ninguém vai entender.
Ou, se entender, não vai aprovar.
Existe em nossa época um paradigma que diz: enquanto você me der carinho e cuidar de mim, eu vou amar você.
Então, eu troco o meu amor por um punhado de carinho e boas ações.
Isso a gente aprende desde a infância: se você for um bom menino, eu vou lhe dar um chocolate. Parece que ninguém é amado simplesmente pelo que é, por existir no mundo do jeito que for, mas pelo que faz em troca desse amor.
E quando alguém, por alguma razão muito íntima, pára de dar carinho e corre para bem longe de você?
A maioria das pessoas aperta um botão de desliga-amor, acionado pelo medo e sentimentos de abandono, e corre em direção aos braços mais quentinhos.
E a história se repete: enquanto você fizer coisas por mim ou for assim eu vou amar você e ficar ao seu lado porque eu tenho de me amar em primeiro lugar.
Mas que espécie de amor é esse?
Na minha opinião, é um amor que não serve nem a si mesmo e nem ao outro.
Eu também tenho medo, dragões aterrorizantes que atacam de quando em quando, mas eu não acredito em nada disso.
Quando eu saí de uma importante depressão, eu disse a mim mesma que o mundo no qual eu acreditava haveria de existir em algum lugar do planeta!
Haveria de existir!
Nem que este lugar fosse apenas dentro de mim... Mesmo que ele não existisse mais em canto algum, se eu, pelo menos, pudesse construi-lo em mim, como um templo das coisas mais bonitas que eu acredito, o mundo seria sim bonito e doce, o mundo seria cheio de amor e eu nunca mais ficaria doente.
E, nesse mundo, ninguém precisa trocar amor por coisa alguma porque ele brota sozinho entre os dedos da mão e se alimenta do respirar, do contemplar o céu, do fechar os olhos na ventania e abrir os braços antes da chuva.
Nesse mundo, as pessoas nunca se abandonam.
Elas nunca vão embora porque a gente não foi um bom menino.
Ou porque a gente ficou com os braços tão fraquinhos que não consegue mais abraçar e estar perto.
Mesmo quando o outro vai embora, a gente não vai.
A gente fica e faz um jardim, um banquinho cheio de almofadas coloridas e pede aos passarinhos não sujarem ali porque aquele é o banquinho do nosso amor, o nosso grande amigo...
Para que ele saiba que, em qualquer tempo, em qualquer lugar, daqui a quantos anos, não sei, ele pode simplesmente voltar... sem mais explicações, para olhar o céu de mãos dadas.
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